Irmã venerável Maria de Ágreda (Espanha, 1602-1665). Obra: "Mística Cidade de Deus. Ed. Mosteiro Portaceli. 2011." [3º Tomo - 2ª Parte - 5º Livro - Cap. 22 - pág. 136:][Nossa Senhora diz a Maria de Ágreda:] Sofrimento, prova de amor: 960. Minha filha, quero que ponderes e penetres mais os mistérios que descreveste e os faças crescer em tua estima, para o bem de tua alma e para me imitares em alguma coisa. Adverte, pois, que na visão da divindade que eu recebi nesta ocasião, conheci no Senhor a estimação que sua vontade santíssima fazia dos sofrimentos, paixão e morte de meu Filho, e de todos aqueles que o imitarem em seguir o caminho da cruz.
Nesta ciência, não só o ofereci, de boa vontade, para entregá-lo à paixão e morte, como também supliquei ao Altíssimo me fizesse companheira e participante de todas suas dores, penas e paixão, o que me foi concedido pelo eterno Pai. Depois pedi a meu Filho e Senhor que me privasse de suas doçuras interiores, para começar a seguir seus passos no caminho da amargura. Esta petição me foi inspirada pelo amor, e pelo Senhor que assim o queria. Estas ânsias de padecer, e o amor que Ele me tinha como Filho e como Deus
me inclinavam a desejar o sofrimento. Porque me amou com ternura mo concedeu, pois aos que ama corrige e aflige (Prov 3, 12). Quis que a mim, sua Mae, não faltasse a excelência da perfeita semelhança com Ele, naquilo que mais estimava na vida humana.
Logo se cumpriu em mim esta vontade do Altíssimo e minha, e me vi sem os favores e consolações que costumava gozar. Desde essa ocasião, não me tratou com tanto carinho. Foi esta uma das razões por que não me chamou de Mãe e sim mulher, nas bodas de Caná, aos pés da Cruz (Jo 2,4; 19,26) e ainda em outras ocasiões em que me tratou com igual gravidade, deixando de usar palavras afetuosas. Muito longe estava isso de ser desamor. Pelo contrário, era a maior delicadeza tornar-me sua semelhante, nas penas que escolhia para Si como inestimável tesouro e herança.
[3º Tomo - 2ª Parte - 6º Livro - Cap. 22 - pág. 382:][Maria de Ágreda diz:] Terceira palavra: Eis aí tua Mãe: 1394. Justificado o bom ladrão, Jesus voltou seu amoroso olhar para a aflita Mãe que, com São João, estava ao pé da cruz.
Falando a ambos, disse primeiro à sua Mãe (Jo 19, 26-27): Mulher, eis aí teu filho; e ao apóstolo: Filho, eis aí tua Mãe. Jesus deu-lhe o nome de mulher e não de mãe, porque este nome era de carinho e doçura e com pronunciá-lo poderia receber certo conforto. Como acima se disse, na paixão Ele não quis nenhum consolo e alívio, e por isto renunciou até a pronunciar o nome de mãe. Naquela palavra mulher, tacitamente quis dizer: Mulher bendita entre as mulheres (Lc 1, 42), a mais prudente entre os filhos de Adão, mulher forte (Prov 31,10) e constante, nunca vencida pela culpa, fidelíssima em amar-me, perfeita em servir-me, a quem as muitas águas de minha paixão não puderam enfraquecer (Cânt 8, 7) nem mudar. Vou para meu Pai, e de agora em diante não posso mais te acompanhar; meu discípulo amado te assistirá e servirá como a mãe, e será teu filho. Tudo isto entendeu a divina Rainha. O santo apóstolo naquela hora a recebeu, sendo seu entendimento novamente iluminado para conhecer e apreciar a maior prenda que a Divindade criara depois da humanidade de Cristo, nosso Senhor. Com esta luz venerou-a e serviu-a durante o resto da vida de nossa grande Rainha como direi adiante. Aceitou-o também a Senhora por filho, com humilde submissão. Desde esse momento prometeu-lhe obediência sem que as imensas dores da paixão embaraçassem seu magnânimo e prudentíssimo coração que sempre praticava o máximo da perfeição e santidade, sem omitir ato algum.