Irmã venerável Maria de Ágreda (Espanha, 1602-1665). Obra: "Mística Cidade de Deus. Ed. Mosteiro Portaceli. 2011." [4º Tomo - 3ª Parte - 8º Livro - Cap. 2 - pág. 216/218:][Maria de Ágreda diz:] Prisão de São Tiago: 396. Quando, porém, os judeus viram seu plano frustrado pela conversão de Hermógenes e Fileto, encheram-se de maior ódio contra o apóstolo São Tiago e
decidiram liquidá-lo tirando-lhe a vida. Para isto, subornaram Demócrito e Lísias, centuriões da milícia romana e, secretamente, combinaram que, com seus subalternos prendessem o apóstolo. Para dissimular a cilada, fingiram um motim onde ele estivesse pregando, e então o entregariam às suas mãos. A execução desta maldade ficou a cargo de Abiatar, sumo sacerdote naquele ano, e de Josias escriba, do mesmo espírito que o sacerdote. Como planejaram, assim fizeram. Estava São Tiago pregando ao povo o mistério da Redenção humana provando-o com admirável sabedoria e testemunhos das antigas Escrituras, de modo que o auditório se compungiu até as lágrimas. O sumo sacerdote e o escriba se inflamaram em furor diabólico. Deram sinal aos romanos e Josias prendeu São Tiago. Lançou-lhe uma corda ao pescoço, acusando-o de perturbador da nação e inventor de nova religião contra o império romano.
São Tiago é condenado à morte: 397. Neste momento, chegaram Demócrito e Lísias com sua gente e prenderam o apóstolo. Levaram-no à Herodes, filho de Arquelau que também estava prevenido, interiormente pela astúcia de Lúcifer, e exteriormente pela malícia e ódio dos judeus. Incitado por estes estímulos, Herodes tinha suscitado contra os discípulos do Senhor a quem aborrecia, a perseguição que São Lucas diz no capítulo 12 dos Atos dos Apóstolos (v. 1). Enviou soldados para afligi-los, prendê-los e
sentenciou São Tiago à morte por degolação, como os judeus lhe pediam.
Foi indizível a alegria de nosso grande apóstolo vendo-se prender e amarrar à semelhança de seu Mestre, e que chegara o momento de passar desta vida mortal à eterna através do martírio, como a Rainha do céu lhe havia dito Fez humildes e fervorosos atos de agradecimento por este favor, e publicamente confessou novamente a santa fé em Cristo, nosso Senhor. E, lembrando-se do pedido que, em Éfeso, fizera à Senhora para o assistir na morte, invocou-a do íntimo da alma.
Maria atende à oração do apóstolo: 398.
De seu oratório, ouviu Maria santíssima estas súplicas de seu amado apóstolo e sobrinho, como quem estava atenta a tudo quanto lhe acontecia, acompanhando-o com sua eficaz oração. A grande Senhora viu descer do céu grande multidão de anjos de todas as jerarquias, e que uma parte deles dirigiu-se a Jerusalém rodeando o santo apóstolo,
quando o conduziam ao lugar do suplício. Outros anjos foram a Éfeso onde estava a Rainha, e um dos mais elevados lhe disse: Imperatriz das alturas e Senhora nossa, o altíssimo Deus e Senhor dos exércitos diz para irdes logo a Jerusalém confortar seu grande servo Tiago, assisti-lo na morte e satisfazer seus santos e piedosos desejos. Maria santíssima aceitou este favor, com alegria e gratidão, e louvou ao Altíssimo pela providência com que defende e ampara os que confiam e vivem sob sua proteção. Neste ínterim o apóstolo era conduzido ao martírio, e pelo caminho fez muitos milagres, curando enfermos e libertando alguns possessos do demônio. Tendo-se divulgado a notícia de que Herodes o mandara degolar, acorriam muitos necessitados à procura do remédio, antes que lhes faltasse quem os socorria.
Maria vai assistir São Tiago: 399.
Nesse mesmo tempo, os anjos receberam sua grande Rainha e Senhora num trono refulgentíssimo, como em outra ocasião disse, e a transportaram para Jerusalém [em corpo e alma] , no lugar onde São Tiago chegava para ser executado. Ajoelhou-se em terra o santo apóstolo para oferecer a Deus o sacrifício de sua vida, e quando levantou os olhos para o céu, viu diante de si, no ar, a Rainha que invocava em seu coração. Viu-a revestida de divino esplendor, com grande beleza, acompanhada pela multidão de anjos que a serviam. Este admirável quadro inflamou-o em ardores de júbilo e caridade, moveu seu coração e potências.
Quis, em alta voz, proclamar Maria santíssima por Mãe de Deus e Senhora de todas as criaturas. Um dos anjos, porém, o deteve naquele fervor e lhe disse: Tiago, servo do nosso Criador, guardai em vosso peito estes preciosos afetos, e não os manifesteis aos judeus a presença e favor de nossa Rainha. Não são dignos nem capazes de compreender, e mais lhe excitarão ódio do que reverência. Com este aviso se conteve o apóstolo e, em silêncio apenas movendo os lábios, falou à Rainha:
Morte de São Tiago 400. Mãe de meu Senhor Jesus Cristo, Senhora e amparo meu, consolo dos aflitos, refúgio dos necessitados, dai-me, Senhora, vossa bênção tão desejada por minha alma nesta hora. Oferecei, por mim, a vosso Filho e Redentor do mundo o sacrifício de minha vida em holocausto, abrasado no desejo de morrer pela glória de seu santo nome. Sejam hoje vossas mãos puríssimas a ara de meu sacrifício, para que o receba com agrado, quem por mim se ofereceu na santa cruz. Em vossas mãos, e por elas, nas de meu Criador encomendo meu espírito.
Ditas estas palavras, tendo os olhos sempre elevados para Maria santíssima que lhe falava ao coração, foi o santo apóstolo degolado. A grande Senhora e Rainha do mundo, — oh! admirável dignação! — recebeu a alma de seu amantíssimo apóstolo a seu lado, no trono onde se encontrava,
e a levou ao céu empíreo [obs.: Maria de Ágrida diz, em várias partes de seu trabalho, que o céu estava fechado apenas para os que nasceram com a mancha do pecado original, o que não é o caso de Nossa Senhora], onde a apresentou a seu Filho santíssimo. Entrou Maria santíssima na corte celestial com esta oferenda, causando a todos os habitantes do céu novo jubilo e glória acidental. Deram-lhe os parabéns com novos cânticos e louvores, enquanto o Altíssimo recebeu a alma de Tiago e a colocou em eminente lugar de glória os príncipes de seu povo.
Maria santíssima, prostrada ante o trono da infinita Majestade, fez um cântico de louvor em ação de graças, pelo triunfo do primeiro apóstolo mártir. Nesta ocasião a grande Senhora não viu intuitivamente a Divindade, mas com visão abstrativa, de que outras vezes tenho falado. Não obstante, a santíssima Trindade encheu-a de novas bênçãos e favores para Ela e a santa Igreja, pela qual Ela fez grandes súplicas. Os santos também a bendisseram,
e com isto os anjos a trouxeram de volta ao seu oratório em Éfeso, onde um anjo esteve representando sua pessoa durante sua ausência. Chegando, a Mãe das virtudes prostrou-se em terra como costumava, agradecendo mais uma vez ao Altíssimo, por tudo o que se passara.