“Mergulhei com vigor renovado em meu estudo do cristianismo antigo e descobri que os primeiros bispos, os Padres da Igreja, tinham feito a mesma "descoberta" que eu fazia a cada manhã. Eles consideravam o livro do Apocalipse a chave da liturgia e a liturgia a chave do livro do Apocalipse. [...] Eu estava aturdido com a novidade de tudo aquilo. Durante anos tentei compreender o livro do Apocalipse como uma espécie de mensagem codificada a respeito do fim do mundo, a respeito do culto no céu distante, a respeito de algo que, em sua maioria, os cristãos não poderiam experimentar aqui na terra. [...] Com o tempo, descobri que era também a conclusão inevitável dos estudiosos protestantes mais rigorosos e honestos. Um deles, Leonard Thompson, escreveu que "até mesmo uma leitura superficial do livro do Apocalipse mostra a presença da linguagem litúrgica disposta em forma de culto.” [pág. 27/28]
“O que João descreve em sua visão era nada menos que o fim do mundo antigo, da antiga Jerusalém, da antiga aliança e a criação de um mundo novo, uma nova Jerusalém, uma nova aliança. Com a ordem do mundo novo surgiu uma nova ordem de culto. [...] No Apocalipse, essas previsões se realizam quando o novo Templo se revela como o corpo místico de Cristo, a Igreja, e quando a adoração "no Espírito" tem lugar na nova Jerusalém celeste.
Do mesmo modo, é fácil entender por que os cristãos primitivos consideravam o véu rasgado do Templo tão significativo do ponto de vista teológico e litúrgico. O véu rasgou-se exatamente quando o corpo de Cristo foi decisivamente rasgado.” [pág. 72]
"No Espírito no dia do Senhor", João viu algo que era mais completo do que qualquer narrativa ou argumento poderia transmitir. Ele viu que parte do mundo já estava transformada em um novo céu e uma nova terra.” [pág. 73]
“Comecei a ler os Padres da Igreja, os autores e mestres cristãos dos oito primeiros séculos e, em especial, seus comentários acerca da Bíblia. Não parei de me chocar com a minha ignorância, já que os Padres referiam-se frequentemente a uma coisa que eu desconhecia: a liturgia. Entretanto, foi interessante descobrir que essa literatura antiga parecia incorporar muitos dos pequenos detalhes do Apocalipse — em um contexto no qual eles faziam sentido! Então, quando passei a ler os estudos exegéticos do Apocalipse pelos Padres, descobri que muitos deles haviam feito a ligação explícita entre a missa e o livro do Apocalipse. De fato, para a maioria dos cristãos primitivos era ponto pacífico: separado da liturgia, o livro do Apocalipse era incompreensível.“Olhe de novo e descubra que o fio de ouro da liturgia é o que junta as pérolas apocalípticas da visão de João: missa dominical 1,10; sumo sacerdote 1,13; altar 8,3-4; 11,1, 14, 18; sacerdotes ("presbyteroi") 4,4; 11,15; 14,3, 19,4; paramentos 1,13; 4,4; 6,11, 7,9; 15,6; 19,13-14; celibato consagrado 14,4; candelabros 1,12, 2,5; penitência caps. 2 e 3; incenso (perfume) 5,8; 8,3-5; o livro 5,1; a hóstia eucarística 2,17; taças (cálices) 15,7; 16; 21,9; o sinal da cruz (o "tav") 7,3, 14,1, 22,4; o Glória 15,3-4; o Aleluia 19,1.3.4.6; Corações ao alto! 11,12; o "Santo, Santo, Santo" 4,8; o Amém 19,4, 22,20; o "Cordeiro de Deus" 5,6 e em todo o livro; a proeminência da Virgem Maria 12,1-6.13-17; intercessão dos anjos e santos 5,8; 6,9-10; 8,3-4; devoção a são Miguel Arcanjo 12,7; antífona 4,8-11, 5,9-14; 7,1-12, 18,1-8; leituras das Escrituras 2-3; 5; 8,2-11; o sacerdócio dos fiéis 1,6; 20,6; catolicidade ou universalidade 7,9; contemplação silenciosa 8,1; o banquete das núpcias do Cordeiro 19,9 17.” [pág. 111/112]
“O Apocalipse é um desvelamento; é esse o sentido literal da palavra grega "apokalypsis". O livro é reflexão visionária que revela uma norma. Com a destruição de Jerusalém, a Igreja deixou definitivamente para trás um belo templo, uma cidade santa e um sacerdócio venerável. Sim, os cristãos adotaram uma nova aliança que, de certo modo, concluía a antiga, mas, de certo modo, também a incluía. O que deviam trazer consigo do culto antigo para o novo? O que deviam deixar para trás! O Apocalipse orientou-os.(br)Algumas coisas haviam sido claramente substituídas na nova revelação. Israel marcava sua aliança com a circuncisão dos filhos varões no oitavo dia, a Igreja selava a nova aliança com o Batismo. Israel celebrava o sábado como dia de descanso e culto; a Igreja celebrava o dia do Senhor, o domingo, o dia da ressurreição. Israel recordava a antiga Páscoa uma vez por ano; a Igreja reencenava a Páscoa definitiva de Jesus Cristo em sua celebração da Eucaristia.” [pág. 114]
“Esse apocalipse, ou desvelamento, aponta para a cruz. Mateus relata que, quando Jesus morreu, "o véu do Santuário rasgou-se em duas partes de alto a baixo" (Mt 27,51). Assim, o santuário de Deus "sofreu um apocalipse", foi desvelado, sua habitação já não estava reservada apenas ao sumo sacerdote. A redenção de Jesus desvelou o lugar santíssimo e abriu a presença de Deus para todos. O céu e a terra agora se uniam em amor íntimo. As liturgias antigas estavam impregnadas da linguagem do céu e da terra. A liturgia de são Tiago declara: "fomos considerados dignos de entrar no lugar do tabernáculo de vossa glória, de ultrapassar o véu e contemplar o Santo dos Santos"”[pág. 116/117]