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Revista Superinteressante (Junho/2000)

Há cerca de 145.000 anos, uma espécie recém-formada de primata começou a proliferar na região central da África. Seus representantes eram poucos — uns 2.000 indivíduos. Se uma catástrofe natural tivesse ocorrido naquele momento, é provável que toda a espécie, o Homo sapiens sapiens, tivesse desaparecido. [...] Mas, daquele grupo primordial, apenas uma mulher deixou uma linhagem duradoura de descendentes. Os cientistas batizaram-na de "Eva". Não sem razão. Todas as populações atuais, dos sul-africanos aos índios da Patagônia, evoluíram dela. Analisando o DNA desses povos, hoje os pesquisadores tentam reconstruir a árvore genealógica dos descendentes de "Eva". Eles descobriram que ela deixou dezoito filhas, que saíram da África para colonizar o mundo e geraram os nossos grandes troncos populacionais. Somos, portanto, os descendentes das dezoito filhas de Eva. Agora, o geneticista americano Peter Underhill, da Universidade Stanford, está atrás do resto da família. Pesquisando o cromossomo Y, um pedaço do material genético transmitido apenas do pai para os descendentes homens, ele acredita haver chegado ao Adão primordial — que pode não ter sido o marido de Eva, mas foi o homem cujas linhagens geraram as nossas. Ele teria deixado dez ramos principais de herdeiros. "Os dados de Underhill são animadores, porque mostram que Adão viveu numa época próxima à de Eva", diz um dos descobridores da primeira mulher, Mark Stoneking, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, na Alemanha. Ambos talvez tenham vivido no mesmo bando. Podem, até, ter tido filhos. Mas a Genética não é capaz de cruzar as informações do DNA mitocondrial com as do cromossomo Y e comprovar a existência de linhagens comuns aos dois. Mesmo porque talvez nem tenha rolado nada. [...] Esse registro vivo se acumula em forma de mutações, nome dado a qualquer mudança em uma determinada seqüência de DNA. Quando um grupo humano se divide e migra para outro ambiente, o código genético de seus membros também acumula mutações distintas. Dentro de um certo espaço de tempo — normalmente alguns milhares de anos — eles geram populações novas. "Conseguimos saber que o homem surgiu na África porque em nenhum outro continente a diversidade genética, ou o número de mutações, é tão grande", explica o biólogo Marcelo Briones, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Os cientistas descobrem essa história contando o número de mutações em dois pedacinhos de DNA. Um deles é o DNA da mitocôndria, a parte da célula responsável pela produção de energia, que, localizada fora do seu núcleo, escapa à mistura de genes do pai e da mãe durante a fecundação. O outro, o cromossomo Y, exclusivamente masculino, também passa ileso pelo embaralhamento genético porque não tem par feminino com o qual se misturar. Cada povo porta o conjunto de mutações que o caracteriza nessas duas fitas de DNA, como se fossem etiquetas genéticas. [...] A época de partida da África dos Homo sapiens também pode ser confirmada pelo DNA. A genética é mais eficiente do que a datação por carbono-14, porque consegue descrever acontecimentos anteriores a 40.000 anos. Daí para trás, o carbono radioativo deixa de ser preciso. [...] "A Genética é um meio mais sofisticado de estudar a História e a evolução, porque consegue descrever um processo em detalhes", afirma Marcelo Briones, da Unifesp.



Obs.: As expressões no texto entre colchetes ou parêntesis destacadas na cor azul não fazem parte do original.