Concílio Vaticano II - Papa Paulo VI (1965) Constituição Lumen Gentium – Capítulo I
A Igreja, sociedade visível e espiritual
8.
Cristo, mediador único, estabelece e continuamente sustenta sobre a terra, como um todo visível, a Sua santa Igreja, comunidade de fé, esperança e amor, por meio da qual difunde em todos a verdade e a graça (9).
Constituição Lumen Gentium – Capítulo VIII – A bem-aventurada virgem Maria Mãe de Deus no mistério de cristo e da igreja
Maria na Anunciação
56. Mas o Pai das misericórdias quis que a aceitação, por parte da que Ele predestinara para mãe, precedesse a encarnação, para que, assim como uma mulher contribuiu para a morte, também outra mulher contribuísse para a vida. É o que se verifica de modo sublime na Mãe de Jesus, dando à luz do mundo a própria Vida, que tudo renova. Deus adornou-a com dons dignos de uma tão grande missão; e, por isso,
não é de admirar que os santos Padres chamem com frequência à Mãe de Deus «toda santa» e «imune de toda a mancha de pecado», visto que o próprio Espírito Santo a modelou e d"Ela fez uma nova criatura (175). Enriquecida, desde o primeiro instante da sua conceição, com os esplendores de uma santidade singular, a Virgem de Nazaré é saudada pelo Anjo, da parte de Deus, como «cheia de graça» (Luc 1,28); e responde ao mensageiro celeste: «eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra» (Luc 1,38). Deste modo, Maria, filha de Adão, dando o seu consentimento à palavra divina, tornou-se Mãe de Jesus e,
não retida por qualquer pecado, abraçou de todo o coração o desígnio salvador de Deus, consagrou-se totalmente, como escrava do Senhor, à pessoa e à obra de seu Filho, subordinada a Ele e juntamente com Ele, servindo pela graça de Deus omnipotente o mistério da Redenção. por isso,
consideram com razão os santos Padres que Maria não foi utilizada por Deus como instrumento meramente passivo, mas que cooperou livremente, pela sua fé e obediência, na salvação dos homens. Como diz S. Ireneu, «obedecendo, ela tornou-se causa de salvação, para si e para todo o gênero humano» (176). Eis porque não poucos, Padres afirmam com ele, nas suas pregações, que «
o nó da desobediência de Eva foi desatado pela obediência de Maria; e aquilo que a virgem Eva atou, com a sua incredulidade, desatou-o a virgem Maria com a sua fé» (177); e, por comparação com Eva, chamam Maria a «mãe dos vivos»(178) e afirmam muitas vezes: «
a morte veio por Eva, a vida veio por Maria» (179).
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Maria na vida pública e na paixão de Cristo
58. Na vida pública de Jesus, Sua mãe aparece de uma maneira bem marcada logo no princípio, quando, nas bodas de Caná, movida de compaixão, levou Jesus Messias a dar início aos Seus milagres. Durante a pregação de Seu Filho, acolheu as palavras com que Ele,
pondo o reino acima de todas as relações de parentesco, proclamou bem-aventurados todos os que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática (Mc 3,35 e paral.; Luc 11, 27-28); coisa que ela fazia fielmente (Luc 2, 19 e 51). Assim avançou a Virgem pelo caminho da fé, mantendo fielmente a união com seu Filho até à cruz. Junto desta esteve, não sem desígnio de Deus (Jo 19, 25), padecendo acerbamente com o seu Filho único, e
associando-se com coração de mãe ao Seu sacrifício, consentindo com amor na imolação da vítima que d"Ela nascera; finalmente, Jesus Cristo, agonizante na cruz, deu-a por mãe ao discípulo, com estas palavras: mulher, eis aí o teu filho (Jo 19, 26-27) (181).
[...]
O influxo salutar de Maria e a mediação de Cristo
60.
O nosso mediador é só um, segundo a palavra do Apóstolo: «não há senão um Deus e um mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, que Se entregou a Si mesmo para redenção de todos (1 Tim 2, 5-6).
Mas a função maternal de Maria em relação aos homens de modo algum ofusca ou diminui esta única mediação de Cristo; manifesta antes a sua eficácia. Com efeito, todo o influxo salvador da Virgem Santíssima sobre os homens se deve ao beneplácito divino e não a qualquer necessidade; deriva da abundância dos méritos de Cristo, funda-se na Sua mediação e dela depende inteiramente, haurindo aí toda a sua eficácia; de modo nenhum impede a união imediata dos fiéis com Cristo, antes a favorece.
A maternidade espiritual
61. A Virgem Santíssima, predestinada para Mãe de Deus desde toda a eternidade simultaneamente com a encarnação do Verbo, por disposição da divina Providência foi na terra a nobre Mãe do divino Redentor, a Sua mais generosa cooperadora e a escrava humilde do Senhor. Concebendo, gerando e alimentando a Cristo, apresentando-O ao Pai no templo, padecendo com Ele quando agonizava na cruz,
cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural.
É por esta razão nossa mãe na ordem da graça.
A natureza da sua mediação
62. Esta maternidade de Maria na economia da graça perdura sem interrupção, desde o consentimento, que fielmente deu na anunciação e que manteve inabalável junto à cruz, até à consumação eterna de todos os eleitos.
De fato, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão salvadora, mas, com a sua multiforme intercessão, continua a alcançar-nos os dons da salvação eterna (185). Cuida, com amor materno, dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, caminham ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada. Por isso, a Virgem é invocada na Igreja com os títulos de advogada, auxiliadora, socorro,
medianeira (186).
Mas isto entende-se de maneira que nada tire nem acrescente à dignidade e eficácia do único mediador, que é Cristo (187). Efetivamente, nenhuma criatura se pode equiparar ao Verbo encarnado e Redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de diversos modos pelos ministros e pelo povo fiel, e assim como a bondade de Deus, sendo uma só, se difunde de diferentes formas pelos seres criados, assim também
a mediação única do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas cooperações diversas, que participam dessa única fonte.
Esta função subordinada de Maria, não hesita a Igreja em proclamá-la; sente-a constantemente e inculca-a aos fiéis, para mais intimamente aderirem, com esta ajuda materna, ao seu mediador e salvador.