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Compêndio da Doutrina Social da Igreja

“401 A doutrina social indica os critérios para o exercício da resistência: “A resistência à opressão do poder político não recorrerá legitimamente às armas, salvo quando se ocorrerem conjuntamente as seguintes condições:
  • 1. em caso de violações certas, graves e prolongadas dos direitos fundamentais;
  • 2. depois de ter esgotado todos os outros recursos;
  • 3. sem provocar desordens piores;
  • 4. que haja uma esperança fundada de êxito;
  • 5. se for impossível prever razoavelmente soluções melhores” [824].
A luta armada é contemplada como extremo remédio para pôr fim a uma “tirania evidente e prolongada que ofendesse gravemente os direitos fundamentais da pessoa humana e prejudicasse o bem comum do país” [825]. A gravidade dos perigos que o recurso à violência hoje comporta leva a considerar preferível o caminho da resistência passiva, “mais conforme aos princípios morais e não menos prometedor do êxito” [826].”
“403 A pena não serve unicamente para o fim de defender a ordem pública e de garantir a segurança das pessoas; esta torna-se, outrossim, um instrumento de correção do culpado, um correção que assume também o valor moral de expiação quando o culpado aceita voluntariamente a sua pena [829]. A finalidade à qual tender, é dúplice: de um lado favorecer a reinserção das pessoas condenadas; de outro lado promover uma justiça reconciliadora, capaz de restaurar as relações de convivência harmoniosa quebrantadas pelo ato criminoso.”
“497. O Magistério condena “a crueldade da guerra” [1032] e pede que seja considerada com uma abordagem completamente nova [1033]: de fato, “não é mais possível pensar que nesta nossa era atômica a guerra seja um meio apto para ressarcir direitos violados” [1034]. A Guerra é um “flagelo” [1035] e não representa nunca um meio idôneo para resolver os problemas que surgem entre as nações: “Nunca foi e jamais o será” [1036], porque gera conflitos novos e mais complexos [1037]. Quando deflagra, a guerra torna-se uma “carnificina inútil” [1038], uma “aventura sem retorno” [1039], que compromete o presente e coloca em risco o futuro da humanidade: “Nada se perde com a paz, mas tudo pode ser perdido com a guerra” [1040]. Os danos causados por um conflito armado, de fato, não são apenas materiais, mas também morais [1041]: a guerra é, ao fim e ao cabo, “a falência de todo o autêntico humanismo” [1042], “é sempre uma derrota da humanidade” [1043]: “nunca mais uns contra os outros, nunca mais, nunca!... nunca mais a guerra, nunca mais a guerra!” [1044].”
“500. Uma guerra de agressão é intrinsecamente imoral. No trágico caso em que esta se desencadeie, os responsáveis por um Estado agredido têm o direito e o dever de organizar a defesa inclusive recorrendo à força das armas [1049]. O uso da força, para ser lícito, deve responder a algumas rigorosas condições: “que:
  • o dano infligido pelo agressor à nação ou à comunidade das nações seja durável, grave e certo;
  • todos os outros meios de pôr fim se tenham revelado impraticáveis ou ineficazes;
  • estejam reunidas as condições sérias de êxito;
  • o emprego das armas não acarrete males e desordens mais graves que o mal a eliminar.
O poderio dos meios modernos de destruição pesa muito na avaliação desta condição. Estes são os elementos tradicionais enumerados na chamada doutrina da “guerra justa”. A avaliação dessas condições de legitimidade moral cabe ao juízo prudencial daqueles que estão encarregados do bem comum” [1050].
Se tal responsabilidade justifica a posse de meios suficientes para exercer o direito à defesa, permanece para os Estados a obrigação de fazer todo o possível para “garantir as condições de paz não apenas sobre o próprio território, mas em todo o mundo” [1051]. Não se deve esquecer que “uma coisa é utilizar as forças militares para justa defesa dos povos, outra coisa é querer subjugar outras nações. O poderio bélico não legitima qualquer uso militar ou político dele mesmo. E depois de lamentavelmente começada a guerra, nem por isso tudo se torna lícito entre as partes inimigas” [1052].”
“502. As exigências da legítima defesa justificam a existência, nos Estados, das forças armadas, cuja ação deve ser posta ao serviço da paz: os que com tal espírito tutelam a segurança e a liberdade de um País, dão um autêntico contributo à paz [1054]. Toda a pessoa que presta serviço nas forças armadas é concretamente chamada a defender o bem, a verdade e a justiça no mundo; não poucos são aqueles que nas forças armadas sacrificaram a própria vida por tais valores e para defender vidas inocentes. O crescente número de militares que atuam no seio de forças multinacionais, no âmbito das “missões humanitárias e de paz”, promovidas pelas Nações Unidas, é um fato significativo [1055].
503. Todo membro das forças amadas está moralmente obrigado a opor-se às ordens que incitam a cumprir crimes contra o direito das nações e os seus princípios universais [1056]. Os militares permanecem plenamente responsáveis pelas ações que cometem em violação dos direitos das pessoas e dos povos ou das normas do direito internacional humanitário. Tais atos não podem ser justificadas com o motivo da obediência a ordens superiores.
Os objetores de consciência, os quais se recusam por princípio a efetuar o serviço militar nos casos em que este seja obrigatório, porque a sua consciência os leva a rejeitar qualquer forma de uso da força, ou mesmo a participação em um determinado conflito, devem estar disponíveis a desempenhar outros tipos de serviços: “Parece justo que as leis prevejam o caso dos que, por imperativos de consciência, recusam tomar as armas, desde que entretanto aceitem servir, de outra forma, a comunidade humana” [1057].”
“507. As sanções, nas formas previstas do ordenamento internacional contemporâneo, miram a corrigir o comportamento do governo de um País que viola as regras da convivência internacional pacífica e ordenada ou que põe em prática formas graves de opressão sobre a população. As finalidades das sanções devem ser precisadas de modo inequívoco e as medidas adotadas devem ser periodicamente verificadas pelos organismos competentes da Comunidade Internacional, para uma objetiva avaliação da sua eficácia e do seu real impacto sobre a população civil. O verdadeiro objetivo de tais medidas é abrir o caminho para as tratativas e o diálogo. As sanções não devem jamais constituir um instrumento de punição direta contra toda uma população: não é lícito que devido às sanções venham sofrer inteiras populações e especialmente os seus membros mais vulneráveis. As sanções econômicas, em particular, são um instrumento a ser utilizado com grande ponderação e a ser submetidos a rígidos critérios jurídicos e éticos [1066]. O embargo econômico deve ser limitado no tempo e não pode ser justificado quando os efeitos que produzem se revelam indiscriminados.”

Catecismo da Igreja Católica

2307. O quinto mandamento proíbe a destruição voluntária da vida humana. Por causa dos males e injustiças que toda a guerra traz consigo, a Igreja exorta instantemente a todos para que orem e atuem para que a Bondade divina nos livre da antiga escravidão da guerra (72). 2308. Cada cidadão e cada governante deve trabalhar no sentido de evitar as guerras. No entanto, enquanto «subsistir o perigo de guerra e não houver uma autoridade internacional competente, dotada dos convenientes meios, não se pode negar aos governos, uma vez esgotados todos os recursos de negociações pacíficas, o direito de legítima defesa» (73). 2309. Devem ser ponderadas com rigor as estritas condições duma legítima defesa pela força das armas. A gravidade duma tal decisão submete-a a condições rigorosas de legitimidade moral. É necessário, ao mesmo tempo:

  • que o prejuízo causado pelo agressor à nação ou comunidade de nações seja duradouro, grave e certo;
  • que todos os outros meios de lhe pôr fim se tenham revelado impraticáveis ou ineficazes;
  • que estejam reunidas condições sérias de êxito;
  • que o emprego das armas não traga consigo males e desordens mais graves do que o mal a eliminar. O poder dos meios modernos de destruição tem um peso gravíssimo na apreciação desta condição.
Estes são os elementos tradicionalmente apontados na doutrina da chamada «guerra justa». A apreciação destas condições de legitimidade moral pertence ao juízo prudencial daqueles que têm o encargo do bem comum. 2310. Os poderes públicos têm, neste caso, o direito e o dever de impor aos cidadãos as obrigações necessárias à defesa nacional. Aqueles que se dedicam ao serviço da pátria na vida militar são servidores da segurança e da liberdade dos povos. Na medida em que desempenharem como convém esta tarefa, contribuem verdadeiramente para o bem comum e para a salvaguarda da paz (74). 2311. Os poderes públicos atenderão equitativamente o caso daqueles que, por motivos de consciência, recusam o uso de armas; estes continuam obrigados a servir, de outra forma, a comunidade humana (75). 2312. A Igreja e a razão humana declaram a validade permanente da lei moral durante os conflitos armados. «Uma vez lamentavelmente começada a guerra, nem por isso tudo se torna lícito entre as partes beligerantes» (76). 2313. Devem ser respeitados e tratados com humanidade os não-combatentes, os soldados feridos e os prisioneiros. As ações deliberadamente contrárias ao direito dos povos e aos seus princípios universais, bem como as ordens que comandam tais ações, são crimes. Uma obediência cega não basta para desculpar os que a elas se submetem. Assim, o extermínio dum povo, duma nação ou duma minoria étnica deve ser condenado como pecado mortal. É-se moralmente obrigado a resistir às ordens para praticar um genocídio. 2314. «Toda a ação bélica, que tende indiscriminadamente à destruição de cidades inteiras ou vastas regiões com os seus habitantes, é um crime contra Deus e o próprio homem, que se deve condenar com firmeza, sem hesitação» (77). Um dos perigos da guerra moderna é o de oferecer aos detentores das armas científicas, nomeadamente atômicas, biológicas ou químicas, ocasião para cometer tais crimes. [...] 2328. A Igreja e a razão humana declaram a validade permanente da lei moral durante os conflitos armados. As práticas deliberadamente contrárias ao direito das gentes e aos seus princípios universais são crimes. 2329. A corrida aos armamentos é um terrível flagelo para a humanidade e prejudica os pobres de uma forma intolerável (81).


Concílio Vaticano II - Papa Paulo VI (1965) (Constituição Gaudium Et Spes – Parte II – Capítulo V)

Natureza da paz e sua consecução
78. A paz não é ausência de guerra; nem se reduz ao estabelecimento do equilíbrio entre as forças adversas, nem resulta de uma dominação despótica. Com toda a exatidão e propriedade ela é chamada «obra da justiça» (Is 32, 7). É um fruto da ordem que o divino Criador estabeleceu para a sociedade humana, e que deve ser realizada pelos homens, sempre anelantes por uma mais perfeita justiça. Com efeito, o bem comum do gênero humano é regido, primária e fundamentalmente, pela lei eterna; mas, quanto às suas exigências concretas, está sujeito a constantes mudanças, com o decorrer do tempo. Por esta razão, a paz nunca se alcança de uma vez para sempre, antes deve estar constantemente a ser edificada. Além disso, como a vontade humana é fraca e ferida pelo pecado, a busca da paz exige o constante domínio das paixões de cada um e a vigilância da autoridade legítima. Mas tudo isto não basta. Esta paz não se pode alcançar na terra a não ser que se assegure o bem das pessoas e que os homens compartilhem entre si livre e confiadamente as riquezas do seu espírito criador. Absolutamente necessárias para a edificação da paz são ainda a vontade firme de respeitar a dignidade dos outros homens e povos e a prática assídua da fraternidade. A paz é assim também fruto do amor, o qual vai além do que a justiça consegue alcançar. A paz terrena, nascida do amor do próximo, é imagem e efeito da paz de Cristo, vinda do Pai. Pois o próprio Filho encarnado, príncipe da paz, reconciliou com Deus, pela cruz, todos os homens; restabelecendo a unidade de todos num só povo e num só corpo, extinguiu o ódio (1) e, exaltado na ressurreição, derramou nos corações o Espírito de amor. [...] Na medida em que os homens são pecadores, o perigo da guerra ameaça-os e continuará a ameaça-los até à vinda de Cristo; mas na medida em que, unidos em caridade, superam o pecado, superadas ficam também as lutas, até que se realize aquela palavra: «com as espadas forjarão arados e foices com as lanças. Nenhum povo levantará a espada contra outro e jamais se exercitarão para a guerra» (Is. 2, 4). [...] Existem diversas convenções internacionais relativas à guerra assinadas por bastantes nações, e que visam a tornar menos desumanas as atividades bélicas e suas consequências; tais, por exemplo, as que se referem à sorte dos soldados feridos ou prisioneiros, e outras semelhantes. Estes acordos devem ser observados. Mais ainda, todos, sobretudo os poderes públicos e os peritos nestas matérias, têm obrigação de procurar aperfeiçoá-los quanto lhes for possível, de maneira a que sejam capazes de melhor e mais eficazmente refrearem a crueldade das guerras. Parece, além disso, justo que as leis tenham em conta com humanidade o caso daqueles que, por motivo de consciência, recusam combater, contanto que aceitem outra forma de servir a comunidade humana. Na realidade, a guerra não foi eliminada do mundo dos homens. E enquanto existir o perigo de guerra e não houver uma autoridade internacional competente e dotada dos convenientes meios, não se pode negar aos governos, depois de esgotados todos os recursos de negociações pacíficas, o direito de legítima defesa. Cabe assim aos governantes e aos demais que participam na responsabilidade dos negócios públicos, o dever de assegurar a defesa das populações que lhes estão confiadas, tratando com toda a seriedade um assunto tão sério. Mas uma coisa é utilizar a força militar para defender justamente as populações, outra coisa é querer subjugar as outras nações. O poderio bélico não legitima qualquer uso militar ou político que dele se faça. Nem, finalmente, uma vez começada lamentavelmente a guerra, já tudo se torna lícito entre as partes beligerantes. Aqueles que se dedicam ao serviço da pátria no exército, considerem-se servidores da segurança e da liberdade dos povos; na medida em que se desempenham como convém desta tarefa, contribuem verdadeiramente para o estabelecimento da paz. [...] 80. Com o incremento das armas científicas, tem aumentado desmesuradamente o horror e maldade da guerra. Pois, com o emprego de tais armas, as ações bélicas podem causar enormes e indiscriminadas destruições, que desse modo já vão muito além dos limites da legítima defesa. Mais ainda: se se empregasse integralmente o material existente nos arsenais das grandes potências, resultaria daí o quase total e recíproco extermínio de ambos os adversários, sem falar nas inúmeras devastações provocadas no mundo e nos funestos efeitos que do uso de tais armas se seguiriam. Tudo isto nos força a considerar a guerra com um espírito inteiramente novo (2). Saibam os homens de hoje que darão grave conta das suas atividades bélicas. Pois das suas decisões atuais dependerá em grande parte o curso dos tempos futuros. Tendo em atenção todas estas coisas, e fazendo suas as condenações da guerra total já anteriormente pronunciadas pelos Sumos Pontífices (3), este sagrado Concílio declara: Toda a ação bélica que tende indiscriminadamente à destruição de cidades inteiras ou vastas regiões e seus habitantes é um crime contra Deus e o próprio homem, que se deve condenar com firmeza e sem hesitação. O perigo peculiar da guerra hodierna está em que ela fornece, por assim dizer, a oportunidade de cometer tais crimes àqueles que estão de posse das modernas armas científicas; e, por uma consequência quase fatal, pode impelir as vontades dos homens às mais atrozes decisões. Para que tal nunca venha a suceder, os Bispos de todo o mundo, reunidos, imploram a todos, sobretudo aos governantes e chefes militares, que ponderem sem cessar a sua tão grande responsabilidade perante Deus e a humanidade. [...] Por tal razão, de novo se deve declarar que a corrida aos armamentos é um terrível flagelo para a humanidade e prejudica os pobres dum modo intolerável. E é muito de temer, se ela continuar, que um dia provoque as exterminadoras calamidades de que já presentemente prepara os meios. [...] 82. É, portanto, claro, que devemos nos esforçar por todos os meios por preparar os tempos em que, por comum acordo das nações, se possa interditar absolutamente qualquer espécie de guerra. Isto exige, certamente, a criação de uma autoridade pública mundial, por todos reconhecida e com poder suficiente para que fiquem garantidos a todos a segurança, o cumprimento da justiça e o respeito dos direitos. Porém, antes que esta desejável autoridade possa ser instituída, é necessário que os supremos organismos internacionais se dediquem com toda a energia a buscar os meios mais aptos para conseguir a segurança comum. Já que a paz deve antes nascer da confiança mútua do que ser imposta pelo terror das armas, todos devem trabalhar por que se ponha, finalmente, um termo à corrida aos armamentos e por que se inicie progressivamente e com garantias reais e eficazes, a redução dos mesmos armamentos, não unilateral evidentemente, mas simultânea e segundo o que for estatuído (4).



Obs.: As expressões no texto entre colchetes ou parêntesis destacadas na cor azul não fazem parte do original.